quarta-feira, 23 de abril de 2014

Carta aberta


São Paulo, 22 de abril de 2014. 


Carta aberta 


Considerando que o CAPS é fruto da reforma psiquiátrica, conforme lei 10216/2001, e que por isso deve conceber o sujeito em seu meio, sem isolar sua psicopatologia do contexto em que ele se encontra; 


* Considerando os princípios do SUS (Sistema Único de Saúde), que entende o CAPS como o núcleo de uma nova clínica, produtora de autonomia, responsabilização e protagonismo; 

* Considerando os princípios do SUAS (Sistema Único da Assistência Social), que incentiva o controle e monitoramento de seus equipamentos praticado pelos usuários dos serviços; 
Considerando os preceitos previstos pela RAPS (Rede de Atenção Psicossocial) de articulação de rede intra e intersetorial e também a definição de protagonismo enquanto "atividades que fomentem a participação de usuários e familiares nos processos de gestão dos serviços e da rede, como assembleias de serviço, participação em conselhos, conferências e congressos, a apropriação e a defesa de direitos, e a criação de formas associativas de organização"; 

Considerando os objetivos das Irmãs Hospitaleiras, que preconizam a oferta de saúde integral, com um caráter eminentemente humanizador, qualidade relacional e respeito pelos direitos da pessoa; 

* Considerando os princípios da Redução de Danos, que relembra que o cuidado do usuário de drogas não considera apenas os danos que as substâncias causam a ele, mas também os danos causados pelo contexto sociocultural e político no qual ele se insere; 

Considerando que a população em situação de rua compõe um grupo de excluídos de direitos sociais e que tal exclusão favorece o uso problemático de drogas; 

Nós, trabalhadores do CAPS AD III Complexo Prates, entendemos ser de nossa competência o desenvolvimento de ações de empoderamento dos usuários. Trata-se do cumprimento de todos os princípios citados acima e do exercício de um papel que nos foi dado. Se o fazemos, não é por escolha pessoal ou institucional, mas atuação ética prevista por lei no desempenho profissional da equipe técnica de um CAPS. 
Quando nos posicionamos em relação ao não uso do jaleco - que nos distancia, desiguala e rotula; quando defendemos a nossa presença em conflitos de usuários com a GCM por acreditarmos que “quando a polícia entra, não precisamos sair"; quando incentivamos os usuários a ocupar espaços de luta pelos seus direitos; em todos esses casos, estamos reafirmando que esse fazer não é apenas dos trabalhadores que o praticam, mas das instituições que representam nesse exercício, visto que nenhuma defende o fim dos direitos humanos ou a criminalização da dependência química. 

Desta forma, reiteramos nosso repudio a qualquer inibição de ações relacionadas a esta prática, bem como nossa indignação frente a qualquer tipo de punição dispensada aos
profissionais que as executam. Dentre tantas outras situações de represália, temos o exemplo recente do afastamento imposto da gerente deste serviço após apresentar postura condizente com os pressupostos elencados e com a opinião da equipe. 

Em nome do sofrimento causado pela não garantia do direito a voz, tanto de usuários como de trabalhadores, solicitamos apoio e incentivo para que as atividades aqui mencionadas sejam concretizadas e sustentadas pelos serviços que, idealmente, as propõem. 

Assinam esta carta, de forma unânime, os trabalhadores do CAPS AD III do Complexo Prates.

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